O Projeto de Lei que pretende regulamentar a instalação de Obras de Arte


"Supercuia"
Foto: divulgação/Zero Hora
O Projeto de Lei 237/09, que trata sobre a instalação e retirada de obras de arte de grande porte em terrenos que pertencem ao município de Porto Alegre, pode ser votado esta semana. A discussão em plenário esteve na pauta da Câmara de Vereadores no último dia 9, mas foi adiada por cinco sessões por acordo entre os vereadores.

Buscando colaborar com o debate sobre o projeto, bem como seu contexto, o Observatório da Cultura de Porto Alegre condensou um conjunto de informações que estão disponíveis para consulta na internet. Sempre que possível, os trechos citados de outras fontes estarão com um atalho para os originais.


Esta primeira postagem trata de apresentar, tópico a tópico, os itens da proposta. Além disso, nos demos a liberdade de tecer comentários sobre alguns dos itens mais polêmicos, como forma de contribuir com o debate. Salientamos que estas opiniões não são necessariamente a opinião institucional da Secretaria Municipal da Cultura ou da Prefeitura de Porto Alegre, mas tão somente da equipe do OCPA.

Baseamo-nos em material localizado na internet, que disponibilizamos no decorrer das postagens.

PROJETO DE LEI 237/09

Dispõe sobre a instalação e a retirada de obras de arte localizadas em próprios do Município de Porto Alegre e dá outras providências.

Art. 1º Fica a instalação de obra de arte em próprio do Município de Porto Alegre condicionada à aprovação de lei.

Parágrafo único. Excetuam-se do disposto no “caput” deste artigo obras de arte de pequeno porte.
O que sugere o Projeto de Lei?
O projeto de Lei sobre a Instalação e Retirada de Obras de Arte de Grande Porte é dividido em dois tópicos, como o próprio nome diz: Instalação e Retirada.

Instalação:
Caso seja aprovado, o processo para que uma Obra de Arte de Grande Porte seja instalada passará por uma padronização dos procedimentos, que incluem obrigatoriamente o envio de projeto de lei à Câmara de Vereadores. Apenas após a aprovação, o Executivo Municipal poderá proceder à instalação. Contudo, não é especificado o que a lei porventura classificaria como "grande porte".


Como é a situação hoje?
A colocação de obras de arte de grande porte em Porto Alegre não é muito frequente. As obras existentes foram instaladas em sua maioria durante o século passado, e seguiram critérios estabelecidos caso-a-caso, de acordo com o período histórico e com a forma de seleção - algumas foram encomendadas pelo governo, presentes de governos estrangeiros ou comunidades de descendentes, outras são oriundas de editais ou concursos, ou são frutos de exposições temporárias e posteriormente se tornaram permanentes. Nem sempre elas passaram pela Câmara de Vereadores.

PROJETO DE LEI 237/09
Art. 3º Caberá ao Executivo Municipal autorizar a instalação da obra de arte no local indicado em lei ou escolher outro, no âmbito do Município de Porto Alegre, observados os seguintes critérios:
No texto original da proposta, de autoria do Ver. Bernadino Vendrúsculo, a Prefeitura ou as secretarias teriam liberdade para escolher o local da instalação, dando preferência para o lugar sugerido no respectivo projeto. No caso de local diverso, desde que esteja de acordo com os critérios estabelecidos. Contudo, uma emenda (Emenda 03) sugerida pela Ver. Mônica Leal defende que a Prefeitura só possa proceder a instalação no local definido no projeto de lei aprovado pelos vereadores, e que a instalação somente ocorra após a análise dos "setores competentes" da Prefeitura.
Emenda nº 03 - 27/02/2014 (Ver. Mônica Leal)

Altera o Art3º:

Art 3º - Para instalação de obras de arte no local indicado em Lei, após a análise dos setores competentes do Município, serão observados os seguintes critérios:


Observatório da Cultura de Porto Alegre:

Exemplo: digamos que o projeto passe sem a Emenda 03. A SMTUR poderia realizar um concurso, selecionar um projeto, enviar para Câmara de Vereadores. Uma vez aprovado, a SMTUR teria liberdade para instalar a obra, de acordo com os critérios pré-estabelecidos. Com a Emenda 03, mesmo aprovado pela Câmara de Vereadores, a SMTURainda teria que passar o projeto pelos setores definidos como competentes da prefeitura, que poderia ser tanto um setor de outra secretaria como um colegiado, por exemplo.

Emenda nº 01 - 27/02/2014

Modifica a redação do art 1º:

Parágrafo único - Excetuam-se do disposto no caput deste artigo obras de arte de pequeno porte e obras de artes de qualquer porte que façam parte de exposição temporária.
Ainda como emenda ao projeto, o próprio autor solicitou o acréscimo (Emenda 01) garantindo que essa obrigatoriedade de procedimento ocorra apenas com Obras de Grande Porte que sejam instaladas em caráter permanente, permitindo que obras desse tipo ainda sejam instaladas como de costume durante eventos com duração determinada, como no caso da Bienal do Mercosul.

PROJETO DE LEI 237/09
Art. 2º Projeto de lei que disponha sobre o referido no art. 1º desta Lei deverá conter:

I – projeto artístico com memorial descritivo da obra de arte, elaborados pelo autor ou detentor de seus direitos;

Padronização dos Documentos

Se aprovado, os documentos necessários para encaminhar um projeto para instalação de nova obra serão os seguintes:

- um documento que registre os detalhes sobre a obra (características físicas, materiais, técnicas empregadas), além de informações sobre o contexto de sua produção, feito pelo autor ou detentor dos direitos sobre a obra.


Observatório da Cultura de Porto Alegre:

Possível motivo: além do registro histórico, tal documento pode garantir que futuramente processos de conservação e restauro possam seguir as determinações originais do artista, evitando danificar ou descaracterizar a obra.

PROJETO DE LEI 237/09
Art. 2º Projeto de lei que disponha sobre o referido no art. 1º desta Lei deverá conter:

II – indicação do local proposto para instalação da obra de arte, com planta baixa;

III – projeto da instalação da obra de arte, assinado por profissional habilitado;

IV – termo de responsabilidade pela manutenção artística da obra de arte; e
- sugestão de lugar para instalar a obra, com planta baixa.
- um documento explicando como vai ser instalada a obra, assinado por engenheiro.
- um termo de responsabilidade pela manutenção artística da obra - documento que registra de quem é a responsabilidade de fazer, por exemplo, a conservação ou restauração ou limpeza da obra.


Observatório da Cultura de Porto Alegre:

Alvo de muitas críticas, especialmente o último item (termo de responsabilidade), o Observatório da Cultura de Porto Alegre considera que existe uma falta de detalhamento no texto do projeto de lei, possível causa da reação negativa por parte da classe artística. Ao nosso ver, esse artigo do projeto de lei merece ser mais detalhado, guardadas as funções do texto de lei e de uma eventual futura regulamentação.

Nossa sugestão é que se dê na redação modificação que esclareça que o levantamento da documentação necessária para envio à Câmara de Vereadores, no contexto desta proposta, não precisa ser de responsabilidad e tão somente do autor da obra, mas também de um setor da prefeitura - seja o que o selecionou, como em muitos dos casos recentes de instalação, seja da Comissão Técnica Permanente de Gerenciamento e Avaliação das Obras de Arte, Monumentos e Marcos Comemorativos em espaços públicos, instituída pelo prefeito José Fortunati através do DECRETO Nº 17.838, DE 25 DE JUNHO DE 2012.

Possível motivo: é de se esperar que ao enviar o projeto de lei para câmara, já se tenha anuência do executivo municipal, donde pode ser tanto SMC, SMAM, DMLU, ou até mesmo o artista com algum parceiro privado.

PROJETO DE LEI 237/09
Art. 2º Projeto de lei que disponha sobre o referido no art. 1º desta Lei deverá conter:

V – Anotação de Responsabilidade Técnica (ART), emitida pelo Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia (CREA), em caso de projeto de instalação de obra de arte com grande dimensão e peso.
- documento de responsabillidade emitido pelo CREA, com dados sobre a execução da instalação, responsável, etc. Diferente do anterior, registra o responsável pela colocação da obra em seu destino.


Observatório da Cultura de Porto Alegre:

Possível motivo: para futura referência no caso da necessidade de realocação, ou mesmo para o caso de erros na execução da instalação.

PROJETO DE LEI 237/09
Art. 3º Caberá ao Executivo Municipal autorizar a instalação da obra de arte no local indicado em lei ou escolher outro, no âmbito do Município de Porto Alegre, observados os seguintes critérios:

I – relação cultural entre a obra de arte e o local onde será instalada;

II – preservação da memória artística e cultural da Cidade;

III – bem-estar estético, cultural e ambiental da população;
Critérios para escolha do local a ser instalado:
Se for aprovado pela Câmara de Vereadores, e o executivo municipal optar pela instalação em outro local (sem Emenda 03), será necessário respeitar os seguintes critérios:
- A obra tem de ter relação cultural ao novo local;
- Preservar a memória artística e cultural da cidade;
- Não ferir o bem-estar estético, cultural e ambiental da população;

O Observatório da Cultura de Porto Alegre considera este item de caráter muito subjetivo para um projeto de lei. A noção de "bem-estar", bem como a própria noção de "ferir" possuem fronteira tênue com conceitos como preconceito estético. Se este item for suprimido, acreditamos que não existirá ônus ao projeto, tendo em vista que o conjunto dos demais critérios já dão conta do que se almeja.

PROJETO DE LEI 237/09
Art. 3º Caberá ao Executivo Municipal autorizar a instalação da obra de arte no local indicado em lei ou escolher outro, no âmbito do Município de Porto Alegre, observados os seguintes critérios:

IV – valorização do ambiente natural;

V – percepção e compreensão dos elementos referenciais da paisagem natural e urbana;

e VI – segurança da população.
- Valorizar o ambiente natural (o espaço circundante);
- Não interfirir na percepção e compreensão dos elementos referenciais circundantes (não interfira, por exemplo, com a visibilidade de sinais de trânsito, ou até mesmo com paisagens - tapar o pôr-do-sol do Guaíba por exemplo);
- Seja seguro para a população.


O Observatório da Cultura de Porto Alegre pergunta: a que tipo de segurança estamos nos referindo aqui?
É compreensível que se refira a segurança no que diz respeito ao processo de instalação da obra, para evitar acidentes com quedas, por exemplo. Mas, também se pode compreender segurança como no contexto da criminalidade. Obras de grande porte podem servir de abrigo para atividades ilícitas, especialmente se não contarem com serviços subjacentes, como iluminação pública adequada. Neste caso, poderia uma grande escultura, por exemplo, não ser instalada em determinado local por causa de uma iluminação precária?

PROJETO DE LEI 237/09
Art. 4º A obra de arte instalada em conformidade com o disposto nesta Lei integrará o patrimônio cultural do Município de Porto Alegre.
Uma vez instalada segundo estes critérios, a obra de arte será considerada pública, e fará parte do patrimônio cultural do município.
Com Emenda 03: mesmo após a aprovação pela Câmara dos Vereadores, os setores competentes da prefeitura podem vetar a instalação caso ela não respeite os critérios estabelecidos.

Observatório da Cultura:

Possível motivo: a partir do termo de responsabilidade de manutenção artística da obra, garantiria-se que os órgãos responsáveis estavam cientes da sua inclusão no seu acervo.

Emenda nº 02 - 27/02/2014

Inclui novo artigo, "onde couber":

Art. O Executivo Municipal poderá estabelecer Parceria Público Privada para a adoção, manutenção e conservação das obras de artes instaladas na cidade.
Se for aprovada a Emenda 02, também de autoria do Ver. Bernadino Vendrúsculo, fica prevista a possibilidade de parcerias público-privadas para fazer a adoção, manutenção e conservação das obras de arte.

PROJETO DE LEI 237/09
Art. 5º Será retirada a obra de arte instalada em próprio municipal, nos casos de:

I – inexistência de termo de responsabilidade pela sua manutenção artística, mediante notificação prévia;

Retirada

Poderá ser removida uma obra que tenha sido instalada antes da aprovação do projeto de lei no caso da inexistência de termo de responsabilidade pela sua manutenção artística, mediante notificação prévia.


Como é a situação hoje?
Para retirar uma obra de arte que não tenha sido aprovada por Lei, a princípio, não há restrições, a não ser o desgaste político que pode ocasionar.

Observatório da Cultura de Porto Alegre:
Talvez a maior parte das críticas que o projeto recebe por parte dos agentes culturais esteja direcionada para os artigos que compõe essa segunda parte do projeto 237/09. O Observatório da Cultura de Porto Alegre está ciente de que pode não ser de bom tom fazer uma lei que estabelece um risco - o de colocar em campos antagônicos artistas e população em geral. Antes, preferimos nos posicionar de maneira que a cobrança institucionalizada por lei deva ser atribuída ao gestor público instituído, do qual fazemos parte. Dito isso, e buscando clarear os contornos destes tópicos polêmicos, perguntamos:  Se a obra em questão já consta no patrimônio cultural do município, quem será notificado? O artista que fez a obra, talvez há muito tempo, ou o executivo municipal?  E quem notificará?

PROJETO DE LEI 237/09
Art. 5º Será retirada a obra de arte instalada em próprio municipal, nos casos de:

II – mudança de destinação da área pública em que estiver instalada;

III – perda da sua relação cultural com o local em que está instalada;

IV – presença de risco à população; ou

V – aprovação de lei que determine sua retirada.
Outras possibilidades para remoção:
- Se a obra estiver em uma área cuja destinação tenha sido alterada. Por exemplo, pode-se retirar obra de arte para fazer alterações na malha viária, para realizar construção de novos edifícios, etc;
- Se a obra perder sua relação cultural com o local em que está instalada;
- Se a obra de arte apresentar risco à população;
- Se houver uma lei que determine sua retirada.

Observatório da Cultura de Porto Alegre:
Finalizando essa contribuição, somos da opinião que, no que diz respeito a remoção de Obras de Arte anteriores a este projeto de lei, o único item que deveria permanecer é este último - "Se houver uma lei que determine sua retirada" - que das opções aventadas ainda é a que permitiria maior controle social por parte da população. Nesse contexto, nos opomos à retirada por perda de relação cultural, dado que a relação cultural de uma obra de arte ao ar livre e seu local passa também pelo debate de educação patrimonial, e não acreditamos que se possa apagar uma parte do passado sem antes ao menos tentar resgatá-lo, compreendê-lo e difundi-lo.

Quanto aos demais itens, não opomos restrições, desde que sejam voltados para as novas instalações que se darão deste momento em diante.

PROJETO DE LEI 237/09
Art. 6º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Em 2011, um vereador propôs o mesmo projeto na Câmara de Vereadores de Fortaleza, Ceará. Em janeiro de 2014 o projeto foi encaminhado para arquivamento, dado que o vereador proponente não possuía mais mandato e o prazo de tramitação expirou.
http://cmfor.virtuaserver.com.br:8080/sapl/consultas/materia/materia_mostrar_proc?cod_materia=61

Documentos na íntegra:

Outros Documentos
DECRETO Nº 17.838, DE 25 DE JUNHO DE 2012.


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19/03/14 - Projeto sobre instalação de obras de arte é retirado da pauta da Câmara - Zero Hora
15/03/14 - O elemento ausente no debate - Artigo Jorge Barcellos
06/03/14 - Participar é o caminho, criticar é retrocesso - Artigo Ver. Bernadino Vendrúsculo
02/03/14 - Uma cidade iconoclasta - Artigo Franscisco Marshall
26/02/14 - Adiada a votação do Projeto das Obras de Arte de Porto Alegre - Ver. Bernadino Vendrúsculo
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25/02/14 - O espaço público e a população - Artigo Ver. Bernadino Vendrúsculo
24/02/14 - Polêmica das Obras de Arte - Ver. Bernadino Vendrúsculo
21/02/14 - A chaminé da colenda vai expelir fumaça - Ver. Bernadino Vendrúsculo

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